“Governos precisam romper com dissonância entre a voz dos mercados e a voz das ruas”, diz Lula

“Governos precisam romper com dissonância entre a voz dos mercados e a voz das ruas”, diz Lula

Durante cerimônia de encerramento do G20 Social, neste sábado (16), no Rio de Janeiro, presidente recebeu documento com as deliberações do encontro, resultado de um ano de construção participativa de consensos na sociedade civil

Ricardo Stuckert

Lula: "Eu dizia que a gente só ia acabar com a fome o dia que a gente transformasse a fome num assunto político. Enquanto ela for apenas um assunto social, ela não será tratada com respeito"

Em um momento histórico para o Brasil e o mundo, o presidente Lula participou, neste sábado (16), do encerramento da Cúpula do G20 Social, no Rio de Janeiro. Ele recebeu o documento com as deliberações do encontro, resultado de um ano de construção participativa de consensos na sociedade civil, que contou com o envolvimento de movimentos sociais, organizações da sociedade civil e grupos de engajamento. O presidente anunciou que, durante a Cúpula dos Líderes do G20, na segunda-feira (18) e na terça-feira (19), defenderá que a fome passe ser tratada como um assunto político.

“Eu dizia que a gente só ia acabar com a fome o dia que a gente transformasse a fome num assunto político. Enquanto ela for apenas um assunto social, ela não será tratada com respeito. É preciso a gente assumir responsabilidade. E é isso que eu vou tentar fazer ao entregar esse documento para os países que estão aí”, afirmou Lula, idealizador do G20 social, que é inédito na história do G20 – grupo que reúne 19 das maiores economias do mundo mais a União Africana e a União Europeia.

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O documento final do encontro pede ambição dos líderes do G20 nos compromissos relacionados aos três pilares da presidência brasileira no grupo – combate à fome, à pobreza e à desigualdade; reforma da governança global; as três dimensões do desenvolvimento sustentável (econômica, social e ambiental). A entrega ao presidente foi feita por representantes da sociedade civil e de movimentos sociais, como a Aliança Internacional de Catadores e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

Para conferir a íntegra o documento, clique aqui.

Lula afirmou que o G20, em razão de sua relevância política e econômica no mundo, tem todas as condições de implementar as ações propostas pela sociedade. “É verdade que os países que estão aí representam 85% do PIB mundial, representam quase 80% do comércio e representam praticamente quase 2 terços da população mundial. Então, a gente pode fazer a diferença, mas se a gente, enquanto dirigente, não assumir, vocês é que têm que fazer a diferença. Gritem, protestem, reivindiquem, porque se não as coisas não acontecem”, disse Lula.

G20 Social na África do Sul

Dirigindo-se ao ministro das Relações Internacionais da África do Sul, Ronald Lamola, Lula disse ter certeza que o país, cuja presidência no G20 se iniciará em 1º de dezembro, dará continuidade ao G20 Social.

“Eu tenho certeza que o presidente [Cyril]Ramaphosa vai fazer um fórum social do G20 na África do Sul, e eu espero estar presente para participar do social e participar do G20 oficial. O que é importante é que este é um momento histórico para mim e um momento histórico para o G20. Ao longo deste ano, o grupo ganhou um terceiro pilar que se somou aos pilares político e financeiro: o pilar social, construído por vocês”, disse Lula, acrescentando que o G20 Social deu “forma à expressão e vontade coletiva, motivada pela busca de um mundo mais democrático, mais justo e mais diverso”.

O presidente ressaltou que, durante o evento, os 13 grupos de engajamento puderem interagir com os chanceleres e com os ministros das Finanças e presidentes de bancos centrais das maiores economias do planeta. “Tive a satisfação de dialogar pessoalmente com os representantes de cada grupo. Nos últimos dias, pela primeira vez na trajetória do G20, a sociedade civil de várias partes do mundo, em suas mais diversas formas de organização, se reuniu para formular e apresentar suas demandas à Cúpula de Líderes”, sublinhou.

Lula lembrou que, nos últimos 16 anos, desde a primeira cúpula, o G20 se consolidou como o principal fórum de cooperação econômica mundial e como importante espaço de. concertação política. Observou, no entanto, que “a economia e a política internacional não são monopólio de especialistas e nem de burocratas, não estão só nos escritórios da bolsa de Nova York ou na bolsa de São Paulo, nem só nos gabinetes de Washington, Pequim, Bruxelas ou Brasília”.

Segundo o presidente, a economia e a política internacional “fazem parte do dia a dia de cada um de nós, alargando ou estreitando as nossas possibilidades. Os membros do G20 têm o poder e a responsabilidade de fazer a diferença para muita gente”.

“Para as mulheres, ao fomentar o empreendedorismo e a autonomia econômica feminina, como fez o grupo de trabalho sobre empoderamento. Para desenvolver os produtos da biodiversidade, como foi a iniciativa sobre a bioeconomia. Para os afrodescendentes, ao adotar o objetivo de desenvolvimento sustentável 18, sobre igualdade racial, como fez o grupo de trabalho sobre desenvolvimento. Para o planeta, ao incentivar a ambição climática em linha com o objetivo de limitar o aquecimento global a um grau e meio, como fez a força tarefa do clima”, afirmou o presidente.

“Nada disso teria sido possível sem a contribuição de todos vocês que estão aqui hoje. A presidência brasileira não teria avançado nas três prioridades que escolheu se não fosse a participação decisiva das organizações e movimentos que integram o G20 Social”, disse.

Lula fez uma convocação: “A mobilização permanente de vocês será fundamental para impulsionar o trabalho da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza e avançar a tributação dos super-ricos”.

O presidente disse que para levar adiante o chamado à ação pela reforma da governança global, assegurando instituições multilaterais mais representativas, “a presidência brasileira do G20 deixará um legado robusto de realizações, mas ainda há muito por fazer para melhorar a vida das pessoas. Para chegar ao coração dos cidadãos comuns, os governos precisam romper com a dissonância cada vez maior entre a voz dos mercados e a voz das ruas”.

Ouça o discurso do presidente Lula pela Rádio PT:

Jornada de trabalho

Ao afirmar que “o neoliberalismo agravou a desigualdade econômica e política que hoje assola as democracias”, Lula afirmou que o G20 precisa discutir uma série de medidas para reduzir o custo de vida e promover jornada de trabalho mais equilibrada.

“Vou levar as recomendações contidas na declaração final que vocês me entregaram aos demais líderes do G20 e trabalhar com a África do Sul para que elas sejam consideradas nas discussões do grupo. Espero que esse pilar social do G20 continue nos próximos anos, abrindo cada vez mais nossas discussões para o engajamento da cidadania”, disse o presidente.

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Mobilização tem que continuar

Lula acrescentou que a cerimônia de encerramento do evento “marca o começo de uma nova etapa que exigirá um trabalho contínuo durante os 365 dias do ano”. “Esse foro social do G20, ele não pode parar aqui. Vocês não estão fazendo o encerramento do foro social. Vocês estão fazendo a abertura de uma luta que vocês vão ter que dar sequência durante 365 dias por ano. Isso aqui é apenas o começo. Não espere a África do Sul pra gente fazer uma nova reunião”, enfatizou.

Mais de 50 mil participantes

O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macêdo, iniciou o discurso destacando os números do G20 Social: 47,9 mil pessoas inscritas e 17 mil participando ativamente dos debates. “Exatamente, presidente, mais de cinquenta mil pessoas transitaram no Boulevard e no território do G20 Social, entre a Praça Mauá e o Boulevard”, sublinhou.

Macêdo cumprimentou o presidente Lula por lançar uma iniciativa que deixará um legado histórico para o Brasil e o mundo: “Isso aqui já está falando por si só, mas eu quero apenas dizer muito brevemente que o homem e a mulher sonham, Deus permite, e a obra nasce. O presidente Lula sonhou, nós sonhamos conjuntamente, e a obra do G20 social nasceu e veio pra ficar”.

O ministro acrescentou que o desejo do governo brasileiro é que o próximo G20, na África do Sul, “seja maior e melhor do que foi o G20 Social brasileiro”.

“Me despedirei vocês dizendo muito obrigado Brasil, muito obrigado a todos os movimentos sociais organizados do Brasil e dos países do G20. O que vocês fizeram aqui foi escrever um capítulo importante da história do nosso país e do mundo. Muito obrigado, presidente Lula, por ter a honra de lutar ao seu lado, seja na luta para a construção da sua liberdade, seja na luta para a construção de ajudar o senhor a mudar o Brasil para melhor e a mudar a nossa gente”, afirmou.

Encontro com secretário-geral da ONU

Horas antes da cerimônia de encerramento do G20 Social, Lula se encontrou com o secretário-geral das Nações Unidas (ONU), António Guterres. “Falei ao secretário-geral da ONU, António Guterres, que vamos dialogar com as próximas sedes do G20 para que adotem como prática a realização do G20 Social, ouvindo as demandas dos movimentos sociais e da sociedade civil”, disse o presidente em uma postagem na rede social X.

Da Redação


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